E eu estava morto. Não sentia mais nada a não ser o frio. Um gosto amargo na boca lembrava-me ferro. Um odor vinha do escuro, algo que não sei explicar. Só sei dizer que era ruim.
Achei que morrer doía, mas senti algo parecido com um picão de agulha, você sabe que irá ser cravado, sentir a ponta adentrando a pele, mas aceita e depois adormece.
Quando a faca entrou na minha carne eu senti o gelo do metal e com isso meus músculos se contraíram e logo em seguida relaxei. Senti cada movimento da faca mesmo no momento em que ela foi tirada de mim.
Lembro-me de ter ouvido a frase: -“Isso é pra você não se meter a granfino seu James Bunda.” Logo em seguida eu apaguei.
Em um relance tentei ouvir o que acontecia a minha volta, mas mais parecia um sinal ruim de um radio transmissor antigo. Parecia estar dentro de uma bolha e às vezes ouvia gritos, mas ao mesmo tempo o vazio. Era como se estivesse com os ouvidos semi fechados. Acho que apaguei logo em seguida.
Senti uma vibração que corria pelo meu corpo, como se meus nervos entrassem em colapso, meus músculos vibravam e meu corpo doía novamente. Não conseguia abrir meus olhos, mas ouvia uma voz familiar a dizer: -“Aguenta cara, não deixa a gente não. Força!”.
Num impulso senti meu peito se encher de ar novamente e meu coração se acelerar bruscamente, parecia uma queda livre.
Acordei com o sol batendo em meu rosto vindo de uma veneziana da janela. Abri um olho e vi um relógio na parede frente à cama. Eram 09h36min da manha. Respirei e corri meus olhos pelo ambiente onde estava. Só vi um teto liso, portas de metal e cortinas, pensei estar morto e aquilo ser o necrotério, mas não era apenas o quarto 303 da ala sul do hospital Gloria.
Perguntei o que havia acontecido e uma voz veio de um canto escuro do quarto: -“Você não conseguiu morrer e veio para o hospital. Vamos cuidar de você”.
-Quem está ai? Viestes me buscar ou estas são memórias póstumas?
_Nem um nem outra, sou apenas um amigo que acompanha tua jornada, teu calvário. Estive presente mesmo quando querias estar sozinho e não ti deixarias nesta hora tão difícil. Tua mãe fora pra casa á alguns instantes atrás, teu pai foi levá-la. Teus irmãos estão na sala de espera, aguardando tua passagem.
- Então o senhor veio me buscar? Estou certo?
_Nem sim, nem não. Acho que eu não me apresentei me chamo Pockey.
-Que engraçado, adorava este nome quando criança.
_Eu sei. Escrevestes varias coisas sobre mim, algumas usando este nome. Não sabes tu, que era eu que ti dizia para escrever e assim me destes uma reputação de escritor internacional. Pockey Valentine, nome de presença.
_ Só posso ti dizer que o que aconteceu foi ruim e que não está na hora de partires. Mas depende de ti querer continuar.
-Como assim continuar. Se eu estou em um hospital é porque estou vivo. Já morri?
_Não morrestes nem estas vivo apenas paira sobre os dois lados.
-Eu não sinto dor, sinto-me bem!
_ Com o acontecido, você tem o direito a deixar seu corpo e voltar em outra encarnação. Você não teve todas as suas aprovações, mas não estava previsto sofrer um atentado para atormentá-lo.
-Então quais são minhas opções?
_Isso eu gosto em você, esta tentativa de tomar as rédeas da própria vida. Então vamos direto ao ponto. Sua primeira opção é desencarnar desta vida e se preparar para assumir outra ou continuar essa da onde esta.
-Isso está muito fácil, quais são as conseqüências das escolhas? Não quero tomar decisão sem saber o que acontecerá.
_Você não notou que não pode saber de tudo que vai acontecer. Tem coisas que nem nós conseguimos prever. O mundo está em constante movimento não temos como predefinir o fim tendo tantas encruzilhadas para passar durante o caminho. Diga-me como é a vida de você hoje.
-É uma vida boa. Tenho trabalho, família, problemas, amor, momentos de paz e de agonia, saúde e doença. Acho que está equilibrado. Como será está nova vida?
_Não sei. Só sei que será diferente. Você está disposto a deixar os problemas pra trás e ter uma segunda chance?
-É tentador. Mas, não posso deixar quem me ama de lado. Eles precisam de mim.
_Mesmo você sendo gay, preconceituoso consigo, sendo errôneo e falho perante a sociedade? Não esqueça que a vida pode ser nova e poderás vir totalmente do outro lado da moeda.

_ Deus. Nosso pai. Ajudai este irmão, que ele consiga manter-se no caminho do bem, que seja vencedor a teus olhos semeando a compaixão divina. Amém. Que assim seja meu filho. Assumiras teu destino e daqui em diante farás teu caminho buscando nas raízes do teu sangue as marquises do teu novo EU.
-Amém.
-Seguiras comigo companheiro?
_Não, vim ti buscar para meu lado. Mas estarei perto quando for à hora.
-Obrigado.
_Não me agradeça. Eu apenas não estou entre os vivos, por enquanto.
-Espero vê-lo novamente. Adorei-te como companheiro na jornada d’Alma.
_ Apenas durma e não saia hoje.
No mesmo instante apaguei. Com a cabeça cheia, mas coração tranqüilo.
Acordei com uma luz sobre meu olho esquerdo, mas desta vez era o médico verificando minhas pupilas e me dizendo: “Boa Noite, bem vindo, teu regresso é aguardado”.
No momento sorri e notei que viver dói.
Ouvi risos ao meu redor. Era minha família que me aguardava. Todos estavam com os olhos injuriados.
-“Deixem pra chorar quando eu me for, creio que não será desta vez. Rsrsrs”
Todos riram de felicidade.
Eu nunca falei nada sobre o que me aconteceu, só sei dizer que fui esfaqueado e tive duas semanas em coma, pelo que foi me dito. Creio que um dia encontrarei novamente aquele que veio me buscar. Mas, ele sabia que eu não podia ir, ainda há coisas que só eu posso fazer, foram incumbências dadas a mim e a ninguém mais.
Farei o melhor possível. Mesmo não sabendo como deve ser o melhor e o pior. Vamos arriscar.
Dionathan Amaral
Outubro de 20 10.
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